Fuente: Diario dos Açores 20/06/2007
O continente asiático é potencialmente o que sentirá mais dificuldades devido à seca e à escassez de água, com as projecções actuais a anteciparem que a situação se continuará a agravar nos próximos anos...
A Europa deve apostar em sistemas de monitorização e alerta para a seca, fortalecendo o intercâmbio de informação entre as nações europeias e adoptando políticas alargadas de mitigação e gestão da falta de água, defendeu um especialista norte-americano. Don Wilhite, do Centro Nacional de Mitigação da Seca, dos Estados Unidos, defende ainda a aposta na criação de um centro europeu de "mitigação da seca", com delegações regionais, a aprovação de metodologias genéricas para combater a seca e a aposta em "sistemas que alertem para o problema mais cedo". Wilhite, que falava no Fórum Internacional da Seca em Sevilha, detalhou os esforços que têm sido desenvolvidos nos últimos anos nos Estados Unidos para combater o problema da carência de água, que afecta cada vez mais habitantes de cada vez mais estados americanos. Uma das medidas mais eficazes centra-se na criação de um mapa de "monitorização local da seca", que reúne dados a nível local, regional e nacional e que, semanalmente, "permite ver as condições de seca em todo o país". Esse mapa, explicou Wilhite, serve para planificar a política de água e até para "que responsáveis locais pela gestão da água antecipem tendências de crise e declarem estados de emergência", caso sejam necessários. No caso da Europa, Wilhite admite que um dos obstáculos é a partilha de informação entre as nações europeias, ainda que estejam já em curso projectos como a instalação na Eslovénia de um centro regional de mitigação da seca ou a criação do Medroplan, o plano de gestão da seca no mediterrâneo. Importante, nos próximos anos, será o novo "Sistema de informação Nacional Integrada da Seca" (NIDIS, na sigla inglesa), cuja legislação foi aprovada em Dezembro de 2006 e que está agora a ser implementado. O NIDIS é um sistema "mais integrado" que permitirá "a qualquer gestor de agua em qualquer altura, em qualquer local, ter acesso a bases de dados e informações comuns com base em sistemas interactivos de decisão que possam ser flexibilizados e adaptados para lidar com situações de seca", explicou Wilhite. "Este é um primeiro passo importante para qualquer política nacional de seca", frisou, referindo que modelos idênticos podem ser adoptados a nível regional ou até global. Apesar da crescente preocupação em torno da seca e de outras questões ambientais, Wilhite destacou no entanto que um dos instrumentos essenciais para a política de gestão da seca, a lei nacional de política de seca, continua por aprovar nos Estados Unidos desde 2001, tendo sido chumbada no congresso por três vezes. Um texto que regressará este ano ou em 2008 ao congresso, e que incluirá agora elementos relacionados com as alterações climáticas, um problema que Wilhite refere que contribuirá para agudizar os problemas da seca já existentes. "A seca é um factor natural que pensávamos que era estático, com pequenas flutuações. Mas as alterações climáticas obrigam a analisar tanto os registos históricos como as previsões e projecções futuras", frisou. Uma opinião partilhada por Mary Ann Dickinson, directora-executiva do "Califórnia Urban Water Conservation Council" (CWCC) que destacou hoje que o problema da seca é "cada vez mais universal". "Nos Estados Unidos 36 estados terão problemas de carências de água fresca nos próximos 10 anos, incluindo estados próximo dos Grandes Lagos, onde há restrições de 15% no consumo", frisou. A nível global, destacou, um terço da população mundial vive em zonas de carências de água, e esse valor aumentará para dois terços em 2025. "A situação é ainda mais grave se houver grandes desastres naturais, como o furacão Katrina, ou outros problemas", frisou. O encontro de Sevilha, que termina hoje, quarta-feira, reúne em Sevilha mais de 150 especialistas de 20 nações, que deverão assinar a Declaração de Sevilha que, entre outros aspectos, defenderá, "acção de forma coordenada" para responder aos problemas que advém da seca, principalmente nos países menos desenvolvidos. Ao mesmo tempo insiste na necessidade da participação de "políticos, organizações públicas e privadas e as pessoas em geral" para que ajudem a "derrotar a seca", uma "responsabilidade de todos". Entretanto, paralelamente ao encontro são conhecidas estimativas das Nações Unidas que sugerem que actualmente mais de 1.100 milhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso a água potável e mais de 2.400 milhões vivem sem sistemas adequados de acesso a água. O problema é particularmente grave entre as crianças, com dados da UNICEF a sugerir que anualmente morrem 1.800 milhões de crianças devido a doenças relacionadas com a falta de água ou a sua fraca qualidade. O continente asiático é potencialmente o que sentirá mais dificuldades devido à seca e à escassez de água, com as projecções actuais a anteciparem que a situação se continuará a agravar nos próximos anos, afirmou hoje um especialista das Nações Unidas. Carlos Fernández-Jáuregui, do Programa Mundial de Avaliação dos Recursos Hídricos (WWAP) da Unesco, explicou que a Ásia, onde reside 60% da população mundial, só tem 36% dos recursos hídricos mundiais, comparativamente à América Latina, por exemplo, onde seis% da população mundial têm 26% da água de todo o mundo. "As projecções actuais indicam que a procura de água, que tende a crescer, será um problema cada vez mais premente na Ásia", disse Fernández-Jáuregui, no Fórum Internacional da Seca. Fernández-Jáuregui recorda que apesar de a seca ser "um problema de todos e que afecta tanto os países desenvolvidos como os em desenvolvimento", a falta de água tem impactos económicos maiores nos países mais pobres, onde as infra-estruturas são mais deficientes e as capacidades de lidar com o problema mais limitadas. Uma situação agravada, tanto nos países ricos como nos pobres, pela ausência de informação "com suficiente base científica ou validez", falta de estratégias ou de organizações capazes de lidar com o tema da escassez de água e falta de gestão adequada dos recursos hídricos. Dados da ONU indicam que o problema da seca e dos eventos associados é responsável por 48% das mortes no planeta, representando perdas avultadas para todos os sectores da economia, desde a agricultura à pesca, do turismo à energia.
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